23 de março de 2006

VII. A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO DE MAX WEBER


Introdução


O sociólogo alemão Max Weber (1864-1920) é um dos fundadores da sociologia. Suas idéias, que abarcavam assuntos múltiplos, da história econômica à sociologia da música, continuam a ser extremamente influentes. Em uma de suas obras mais conhecidas, Weber afirmou que havia um elo entre a emergência do protestantismo e a ascensão do capitalismo.

Weber foi um dos primeiros a atentar para a importância da burocracia, que analisava como uma forma de organização social ligada a um determinado tipo de poder institucionalizado pela tradição ou através de leis. A burocracia consiste numa hierarquia de cargos remunerados e claramente definidos, preenchidos por indivíduos livres, selecionados de acordo com seus méritos e capazes de ascender. Weber aprofundou também a análise da estratificação social, defendendo, por exemplo, que pertencer a uma classe poderia não depender apenas de critérios econômicos ou ocupacionais, mas também de outros atributos, enfatizando o papel do status (condição de reconhecimento ou prestígio social de que desfruta um grupo ou indivíduo) na desigualdade social.

De acordo com Weber, a sociologia deveria se preocupar com a interpretação e explicação do comportamento social abrindo mão do tipo de observação e descrição preconizado pelas abordagens influenciadas pelo positivismo de Comte. Weber preocupava-se com a responsabilidade social dos cientistas políticos e defendia a busca da neutralidade cientifica na vida acadêmica. As convicções pessoais não deveriam interferir na investigação e na análise. A principal obra sociológica de Weber é Economia e Sociedade, publicada postumamente (1922).


1. A ação social: uma ação com sentido

A forma de administração do Oriente, para Weber, era irracional. Os funcionários que eram indicados para o posto administrativo não tinham conhecimento da jurisprudência e tão pouco uma preparação específica para o cargo. O tipo de administração oriental não era baseada em um governo regido por leis, como no Ocidente, mas sim por uma espécie de concepção mágica.

O objetivo da investigação da sociologia de Weber é a ação social, a conduta humana dotada de sentido, de uma justificativa subjetivamente elaborada. Assim, o ser humano passou a ter, enquanto indivíduo, significado e especificidade. É ele que dá sentido à sua ação social: estabelece a conexão entre o motivo da ação, a ação propriamente dita e seus efeitos.

Vimos que para o positivismo, a ordem social submete os indivíduos como força exterior a eles. Para Weber, ao contrário, não existe oposição entre indivíduo e sociedade: as normas sociais só se tornam concretas quando se manifestam em cada indivíduo sob a forma de motivação. Cada sujeito age levado por um motivo que é dado pela tradição, por interesses racionais ou pela emotividade. O motivo que transparece na ação social permite desvendar o seu sentido, que é social na medida em que cada indivíduo age levando em conta a resposta ou a reação de outros indivíduos.

A tarefa do cientista é descobrir os possíveis sentidos das ações humanas presentes na realidade. O sentido é expressão da motivação individual, formulado pelo agente ou implícito em sua conduta. Para Weber, o caráter social da ação individual decorre da interdependência dos indivíduos, ou seja, um ator age sempre em função de sua motivação e da consciência de ator em relação a outros atores.

Ao cientista compete descobrir os possíveis sentidos da ação humana. As conexões estabelecidas entre motivos e ações sociais revelam as diversas instâncias da ação social: política, econômica ou religiosas. Por exemplo, o ato de enviar uma carta se decompõe em uma série de ações sociais com sentido: escrever, selar, enviar e receber. Terminam por realizar um objetivo. Por outro lado, muitos agentes ou atores estão relacionados a essa ação social: a atendente, o carteiro etc. Essa interdependência entre os sentidos das diversas ações é que dá a esse conjunto de ações seu caráter social.

É o indivíduo que, por meio dos valores sociais e de sua motivação, produz o sentido da ação social. Isso não significa que cada sujeito possa prever com certeza todas as conseqüências de determinada ação. Por mais individual que seja o sentido da minha ação, o fato de agir levando em consideração o outro dá um caráter social a toda ação humana. Assim, o social só se manifesta em indivíduos, expressando-se sob forma de motivação interna e pessoal.

Weber distingue a ação da relação social. Para que se estabeleça uma relação social, é preciso que o sentido seja compartilhado. Por exemplo, um sujeito que pede uma informação a outro estabelece uma ação social: ele tem um motivo e age em relação a outro indivíduo, mas tal motivo não é compartilhado. Numa sala de aula, onde o objetivo da ação dos vários sujeitos é compartilhado, existe uma relação social.


2. O tipo ideal

Para atingir a explicação dos fatos sociais, Weber propôs um instrumento de análise que chamou de tipo ideal. Assim, por exemplo, em "As causas sociais do declínio da cultura antiga", ele define o patrício romano no auge do império: “o tipo do grande proprietário de terra romano não é o do agricultor que dirige pessoalmente a empresa, mas é o homem que vive na cidade, pratica a política e quer antes de tudo, receber rendas em dinheiro. A gestão de suas terras está nas mãos dos servos inspetores.”

Trata-se de uma construção teórica abstrata a partir dos casos particulares analisados. O cientista, pelo estudo sistemático das diversas manifestações particulares, constrói um modelo acentuando aquilo que lhe pareça característico ou fundante. Nenhum dos exemplos representará de forma perfeita e acabada o tipo ideal, mas manterá com ele uma grande semelhança e afinidade, permitindo comparações e a percepção de semelhanças e diferenças. Constitui-se em um trabalho teórico indutivo que tem por objetivo sintetizar aquilo que é essencial na diversidade das manifestações da vida social, permitindo a identificação de exemplares em diferentes tempos e lugares.

O tipo ideal não é um modelo perfeito a ser buscado pelas formações sociais históricas nem mesmo qualquer realidade observável. É um instrumento de análise científica, numa construção do pensamento que permite conceituar fenômenos e formações sociais e identificar na realidade observada suas manifestações.

É preciso deixar claro que o tipo ideal nada tem a ver com as espécies sociais de Durkheim, que pretendiam ser exemplos de sociedades observadas em diferentes graus de complexidade num continum evolutivo.


3. Alguns aspectos da "Sociologia da Educação" de Weber.

Bem, mas para Weber, o que isso tem a ver com a educação?

O Estado precisa de uma burocratização e um direito racional, assim como as empresas capitalistas precisam de funcionários lógicos, que visem o maior lucro, e saibam se basear no cálculo de custos e benefícios. E o jeito para que eles consigam isso é transformando a educação em uma educação racionalizada, onde o homem esteja desencantado – livre de concepções mágicas –, e que seja obediente somente ao direito racional.

Então, para Weber, a sociologia da educação passa a ter duas novas finalidades pedagógicas: 
1- preparar o aluno para uma conduta de vida e 2- transmitir o conhecimento especializado.

O primeiro, Weber dá o nome de pedagogia do cultivo. E para explicar essa pedagogia Weber escreve um texto chamado "Os Letrados Chineses". A pedagogia do cultivo tem como objetivo educar um tipo de homem culto, isto é, prepará-lo culturalmente para a camada social onde vive, fazendo com que ele adquira certos tipos de comportamentos interiores (reflexidade) e exteriores (comportamento social) na vida. Esse tipo de educação pode ser comparada à educação humanista do Ocidente.

A pedagogia do cultivo foi durante séculos a forma mais importante de educação da China. A qualificação para admissão de funcionários administrativos, era realizada por exames que se preocupavam em avaliavam o quanto de literatura o candidato possuía, e se ele tinha um modo de pensar culto. Esses exames não comprovavam habilitações especiais, mas sim o quanto de carisma tinha o candidato. Esses funcionários do governo chinês eram os letrados. Na prática eles não governavam, apenas intervinham em caso de acidentes, pois, como já foi dito no início do texto, não tinham uma formação administrativa para assumir o cargo. Esse cargo era de extrema importância e respeito, pois lhes eram atribuídos qualidades mágicas e carismáticas. Os letrados tinham privilégios estamentais e sociais.

A educação chinesa era voltada para a formação culta do indivíduo. Vejamos como essa educação se dava nas escolas.

As escolas de séries iniciais desenvolviam provas de redação, estilo, domínio de autores clássicos. Sua educação literária consistia em hinos, contos épicos, rituais e cerimônias. A partir dos sete anos, a educação era separada pelo sexo. O “livro da escola” era um cerimonial de regras para o autocontrole, além de piedade e medo para com os pais e as pessoas mais velhas.

A educação superior pública dependia de um vestibular para seu ingresso. Era totalmente literária, não militar, ensinava as artes da dança, das armas e dos ritos. A música tinha uma significação mágica na educação, pois era ela que mantinha os “espíritos encadeados”.

O desenvolvimento da escrita chinesa era muito maior do que a oratória por motivos lingüísticos, pois a língua monossilábica chinesa exige uma percepção muito maior do som e do tom. Todo tipo de intelectualismo falado era então considerado pobre. A perfeição da escrita deveria era valorizada. Por esse motivo, os alunos das séries iniciais, antes mesmo de aprender o significado dos símbolos, passavam dois anos aprendendo a pintar aproximadamente dois mil caracteres.

A educação chinesa era tradicional, leiga, pois tinha um caráter ritualista de cerimonial. As escolas não tinham interesse pelas ciências e pela filosofia. Esta não tinha um caráter racional, como a ocidental. Todos os problemas básicos da filosofia ocidental eram desconhecidos na filosofia chinesa. Até mesmo o cálculo foi perdendo sua importância com o tempo. Não era mais mencionado nem na pedagogia posterior. Os comerciantes tinham que aprender o cálculo durante seu ofício, nos escritórios.

A segunda finalidade da educação Weber chamou de pedagogia do treinamento. Nesta Weber diz que a educação perdeu o sentido próprio da palavra. A educação tinha como objetivo desenvolver os talentos humanos. Mas com o crescimento da burocratização, da racionalização, da dominação política e das grandes corporações capitalistas privadas, a educação passa a ter o objetivo de formar um homem cada vez mais especializado, que busca apenas ascensão social e riqueza material e não um homem que busque sua liberdade.

E para Weber, essa racionalização é invencível, portanto não há nada que se possa fazer. Iremos aprofundar esta questão no texto do Alberto Tosi Rodrigues. Enquanto isso, você poderá aprofundar a questão conferindo estes textos.

"Uma introdução a Max Weber e à obra 'A Ética Protestante e o Espírito Capitalista'” de Franklin Ferreira, disponível
em: http://www.mackenzie.com.br/teologia/fides/vol05/num02/Franklin.pdf

"A educação à luz da teoria sociológica weberiana, de Wânia R. C. Gonzalez, disponível em:
http://www.anped.org.br/25/minicurso/educacaoteoriaweberiana.doc

"Educação e liberdade em Max Weber" uma resenha do livro de Alonso Bezerra de Carvalho, disponível em: http://www.espacoacademico.com.br/043/43res_carvalho.htm